O vereador de Curitiba Renato Freitas (PT) foi acusado de invadir a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos em fevereiro, durante protestos de repúdio ao assassinato do congolês Moïse Kabagambe e de Durval Teófilo Filho.
Em junho, os vereadores da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovaram o projeto de resolução que determinou a perda de mandato de Freitas por "procedimento incompatível com o decoro parlamentar".
Em julho, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) suspendeu a sessão da CMC que cassou o mandato do vereador.
Confira abaixo a cronologia dos fatos:
Quem é Renato Freitas
Invasão de igreja durante protestos
Representações por quebra de decoro
Freitas pede de desculpas
CMC aceita representações
Freitas se afasta do mandato
Pedido de arquivamento de processo
Prosseguimento do procedimento ético-disciplinar
Arquidiocese pede que Freitas não tenha mandato cassado
Conselho encerra oitivas com depoimento de Freitas
Márcio Barros deixa Conselho de Ética
Conselho recusa pedido de nulidade de processo
Relator do processo pede cassação do mandato do vereador
Ofensas racistas em e-mail atribuído a relator
Maioria do Conselho de Ética vota pela cassação
Corregedoria abre sindicância para apurar e-mail racista
Recurso na CCJ pedindo nulidade do processo
Justiça suspende sessão marcada para julgar cassação
Câmara recorre de decisão que suspendeu sessão
Justiça nega pedido da CMC para retomar sessão
E-mail com ofensas racistas enviado a Freitas foi forjado
Em 1º turno, maioria dos vereadores aprova cassação
Renato Freitas perde mandato na Câmara
Ana Júlia assume vaga deixada por Renato Freitas
Justiça suspende sessão que cassou mandato de Renato Freitas
Quem é Renato Freitas
Renato de Almeida Freitas Junior tem 37 anos e é natural de Sorocaba (SP). Ele possui uma filha, chamada Aurora.
Freitas é graduado e mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Pesquisador na área de Direito Penal, Criminologia e Sociologia da Violência, ele trabalhou na Defensoria Pública do Estado do Paraná e atuava como professor universitário e advogado popular.
Autodeclarado de esquerda, Renato Freitas participou de três eleições. Em 2016, disputou uma das vagas para a Câmara de Curitiba pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).
Em 2018, já pelo PT, foi candidato a deputado estadual, quando obteve 15 mil votos. No terceiro pleito consecutivo, mas para a CMC, conquistou uma das cadeiras com 5.097 votos. Educação, segurança e moradia são as principais bandeiras do vereador.
Invasão de igreja durante protestos
A invasão da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos aconteceu no dia 5 de fevereiro, durante protestos de repúdio ao assassinato do congolês Moïse Kabagambe e de Durval Teófilo Filho. O vereador integrava a ação.
O ato foi organizado pelo Coletivo Núcleo Periférico, com participação de representantes do movimento negro, movimento de mulheres e imigrantes que residem em Curitiba e relataram violências racistas.
Conforme o parlamentar, o local do ato foi escolhido pela relação histórica que possui com a população negra na cidade: "A Igreja, inaugurada em 1737, foi construída por e para pessoas escravizadas, uma vez que negros e negras não poderiam entrar em outras igrejas de nossa cidade".
Na época, a Arquidiocese de Curitiba registrou Boletim de Ocorrência contra Renato Freitas. Segundo a Polícia Civil, o caso permanece sendo investigando.
O padre Luiz Hass disse que celebrava uma missa no local e que precisou interromper o culto diante da entrada dos manifestantes no templo. Freitas alegou que o culto tinha acabado.
Representações por quebra de decoro
Dois dias depois, os vereadores Éder Borges (PSD), Pier Petruziello (PTB) e Pastor Marciano Alves (Republicanos) protocolaram representações por quebra de decoro contra Renato Freitas, após o petista participar do protesto dentro da igreja.
"Os atos praticados pelo parlamentar foram além do considerado ilegal sob o ponto de vista do direito, mas também feriu a moral social coletiva perante a sociedade, ensejando, inclusive, a manifestação dos setores organizados da sociedade civil", afirmou Pier Petruziello na representação.
Éder Borges classificou o episódio como de "extrema gravidade" e ressaltou que o Código de Ética e Decoro estabelece que os parlamentares tenham conduta digna e compatível com o cargo que ocupam.
Freitas pede de desculpas
Durante sessão da CMC, em 9 de fevereiro, pediu desculpas a pessoas que tenham se ofendido pela situação.
"Algumas pessoas se sentiram profundamente ofendidas, e para essas pessoas eu sinceramente e profundamente peço perdão. Desculpa. Não foi, de fato, a intenção de magoar ou de algum modo ofender o credo de ninguém. Até porque eu mesmo, como todos sabem, sou cristão", disse.
O vereador afirmou que a missa já havia sido encerrada quando "de forma espontânea, as pessoas entenderam que passar a mensagem da valorização da vida dentro da igreja seria adequado”.
CMC aceita representações
No dia seguinte, a CMC admitiu quatro representações por quebra de decoro contra o vereador.
Segundo a Casa, foram apresentadas representações pelos vereadores Eder Borges (PSD), Pier Petruzziello (sem partido), Pastor Marciano Alves e Osias Moraes, ambos do Republicanos, além dos advogados Lincoln Machado Domingues, Matheus Miranda Guérios e Rodrigo Jacob Cavagnari.
Além dos quatro pedidos que foram aceitos, houve uma quinta representação foi registrada pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), pelo mesmo motivo, mas esta acabou sendo rejeitada por não cumprir um requisito necessário: o de partir de uma pessoa física e não de um partido político.
Os pedidos foram encaminhados à Comissão de Ética, para apuração da conduta de Renato no caso.
Freitas se afasta do mandato
Em 16 de fevereiro, Renato Freitas se afastou do mandato na CMC por cinco dias, alegando questões de saúde.
As questões de saúde que motivaram o afastamento não foram informadas no documento, porém, em nota, a assessoria de Freitas disse que o vereador estava sendo ameaçado de morte após o episódio, que teve repercussão nacional.
"O vereador tem sido alvo de ameaças constantes e cada vez mais violentas, como ameaças de morte e injúrias raciais. Por isso precisou de repouso para se recuperar de tamanha violência", disse a nota.
Pedido de arquivamento de processo
Em 17 de março, o vereador protocolou a defesa prévia junto ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da CMC. No documento, o parlamentar negou ter invadido a igreja.
O documento protocolado pelo parlamentar também pediu o arquivamento do processo, alegando que o mesmo é "insubsistente, totalmente descabido e verdadeiramente temerário".
O advogado Guilherme de Salles Gonçalves disse que Renato não liderou a manifestação e tampouco praticou "qualquer conduta incompatível com o exercício da sua função".
Prosseguimento do procedimento ético-disciplinar
Contudo, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da CMC aprovou, em 21 de março, por unanimidade, o prosseguimento do procedimento ético-disciplinar contra Freitas. A decisão, aprovada entre sete membros, foi tomada após análise da defesa prévia do parlamentar.
O relator do processo foi o vereador Sidnei Toaldo (Patriota), que segundo o conselho, não faz analise do mérito do caso, mas sim se houve infração ético-disciplinar praticada pelo vereador.
O processo entrou em instrução processual, momento em que depoimentos de testemunhas foram colhidos.
Arquidiocese pede que Freitas não tenha mandato cassado
No dia 28 de março, a Arquidiocese de Curitiba apresentou ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara de Vereadores (CMC), um documento pedindo para que o vereador não tivesse o mandato cassado.
Ao sugerir para que não haja cassação de mandato, a Arquidiocese de Curitiba afirmou que a luta contra o racismo é legitima, tem o respaldo da igreja, todavia, o ato endossado pelo vereador, conforme a arquidiocese, teve excessos.
"A movimentação contra o racismo é legitima, fundamenta-se no Evangelho e sempre encontrará o respaldo da Igreja. Percebe-se na militância do vereador o anseio por justiça em favor daqueles que historicamente sofrem discriminação em nosso país. A causa é nobre e merece respeito. Todavia, não se pode negar que os fatos ocorridos apresentaram certos excessos. O vereador procurou as autoridades religiosas, reconheceu o seu erro e pediu desculpas".
Conselho encerra oitivas com depoimento de Freitas
O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da CMC encerrou, em 11 de abril, a série de oitivas no procedimento ético-administrativo que avaliou os pedidos de cassação do mandato do vereador.
A sessão foi finalizada com a defesa oral de Freitas, sabatinado por oito vereadores.
"Eu fui só mais uma das pessoas a chamar as pessoas a participarem da manifestação, assim como entidades grupos e grupos de pessoas. Não tínhamos nenhuma ideia do que poderia a ver a entrada na igreja. Foi algo espontâneo", disse ele.
Freitas teve 10 dias para apresentar a defesa final no processo.
Márcio Barros deixa Conselho de Ética
O vereador Márcio Barros (PSD) deixou o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da CMC na reta final do julgamento de procedimento disciplinar que pede a cassação do também vereador Renato Freitas.
Barros comunicou a saída do conselho em 25 de abril, em meio a uma polêmica sobre vazamento de áudios particulares que, segundo o vereador, foram direcionados a um amigo em um aplicativo de mensagens.
A defesa do vereador Freitas alegou que, no áudio, Barros adiantou que votaria favoravelmente pela cassação do parlamentar e, por isso, pediu a suspensão da investigação.
Ao g1, Barros negou ter antecipado seu voto e disse que se desligou do conselho para evitar que o julgamento tenha risco de ser anulado.
Conselho recusa pedido de nulidade de processo
Em 27 de abril, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara recusou os pedidos apresentados pela defesa de Freitas solicitando a suspeição e nulidade do processo ético-disciplinar contra o parlamentar.
Os pedidos foram analisados pelo relator do processo contra Freitas, vereador Sidnei Toaldo (Patriota), que avaliou as demandas como improcedentes, uma vez que Barros desistiu da vaga no colegiado, o que "retirou o objeto de suspeição". Argumentação similar se aplicou ao pedido de nulidade e arquivamento.
A reunião foi conduzida pela presidente interina, vereadora Maria Letícia (PV), que pautou as demandas da defesa. Os cinco membros seguiram o voto do relator e descartaram os pedidos.
Relator do processo pede cassação do mandato do vereador
Em 6 de maio, Sidnei Toaldo (Patriota) concluiu o parecer do caso com o pedido pela cassação do mandato do parlamentar. Na conclusão, Toaldo aponta que o parlamentar disse "palavras de natureza político-ideológica" junto aos manifestantes.
Conforme o parecer, imagens registradas do caso mostram que em nenhum momento Renato deixa "a liderança da manifestação e nem pede que os manifestantes se abstenham de tais práticas. Ao contrário, segue na liderança da manifestação, dirigindo-se aos manifestantes, em frente ao altar".
Na conclusão, Toaldo relatou ainda que houve quebra de decoro por parte de Freitas.
Ofensas racistas em e-mail atribuído a relator
No dia 10 de maio, Renato Freitas denunciou à Câmara que recebeu um e-mail com ofensas racistas e ameaças contra o mandato dele e de outros vereadores negros da cidade.
"A Câmara dos Vereadores de Curitiba não é seu lugar, Renato. Volta para a senzala", disse o autor da mensagem.
"A Câmara dos Vereadores de Curitiba não é seu lugar, Renato. Volta para a senzala", disse o autor da mensagem.
A mensagem foi atribuída ao e-mail do vereador Sidnei Toaldo, pelo sistema interno do Legislativo. À época, ele negou ter sido o autor da mensagem e afirmou que registrou o caso junto à Polícia Civil para que seja apurado o uso indevido da conta dele.
Maioria do Conselho de Ética vota pela cassação
Com cinco votos favoráveis, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da CMC decidiu, em 10 de maio, pela cassação do mandato do vereador.
Com a definição do colegiado, foi protocolado um Decreto de Cassação para ser avaliado pelo plenário.
Corregedoria abre sindicância para apurar e-mail racista
No dia seguinte, a Corregedoria da CMC abriu sindicância para apurar a autoria do e-mail com teor racista enviado ao vereador Renato Freitas e atribuído à conta institucional do vereador Sidnei Toaldo.
Ao g1, o gabinete de Toaldo informou que a abertura de sindicância atendeu a um pedido do próprio vereador. A defesa de Renato Freitas também alega que a abertura do procedimento acontece após a apresentação de um ofício apresentado por Freitas à corregedoria e à presidência da Câmara.
A portaria que instaurou a sindicância cita que "há dúvida razoável acerca da autoria do vereador Sidnei Toaldo e da materialidade quanto à mensagem de e-mail que teria sido encaminhada".
Recurso na CCJ pedindo nulidade do processo
No dia 17 de maio, a defesa do vereador Renato Freitas entrou com um recurso na CCJ, pedindo a anulação do Processo Ético Disciplinar (PED) contra ele.
O advogado Guilherme de Salles Gonçalves disse que caso a CCJ não opte pela anulação, a defesa solicita o adiamento da votação que iria decidir pela cassação ou não, em plenário, do vereador.
"O que a gente pretende é que a CCJ, diante das flagrantes inconstitucionalidades das violações regimentais que nós denunciamos e reiteramos, reforme a decisão do Conselho de Ética e, no máximo, envie para deliberação do plenário a recomendação de suspensão por seis meses, condenando o arquivamento", disse.
Justiça suspende sessão marcada para julgar cassação
Na manhã de 19 de maio, a Justiça suspendeu a sessão extraordinária que julgaria o pedido de cassação do vereador Renato Freitas na CMC. A votação ocorreria as 13h do mesmo dia.
A juíza da 5ª Vara da Fazenda Pública, Patricia de Almeida Gomes Bergonse, acatou parcialmente o pedido de suspensão do julgamento até a conclusão da sindicância interna da CMC a respeito do uso indevido do e-mail institucional para ofensas racistas relacionadas ao Processo Ético Disciplinar (PED).
Câmara recorre de decisão que suspendeu sessão
No dia seguinte, a Câmara recorreu ao Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) para retomar a sessão de cassação do mandato do vereador.
Para respaldar o pedido, a CMC apresentou um estudo prévio solicitado pela Corregedoria da Casa de Leis, que detalha dados apurados pela Diretoria de Tecnologia de Informação e Comunicações, negando a autoria de Toaldo no e-mail.
No documento, a diretoria diz que, para o envio, foi utilizado um serviço de e-mail anônimo, hospedado na República Tcheca, que não armazena registros para auditoria ou mapeamento de informações, tais como hora, data e endereço de envio.
"Percebe-se que houve claro objetivo de forjar o remetente da mensagem, simulando as credenciais de envio como sendo as do vereador Sidnei Toaldo. Tal serviço de envio de e-mails anônimos pode ser acessado por qualquer pessoa e facilmente é possível reproduzir a fraude".
Justiça nega pedido da CMC para retomar sessão
No mesmo dia, a 4ª Câmara Cível do TJ-PR negou o recurso apresentado pela Câmara que solicitava a retomada da sessão, que poderia cassar o mandato de Freitas.
De acordo com a desembargadora Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, é prudente esperar o fim da sindicância que apura possível parcialidade de relator do processo contra Renato Freitas no Conselho de Ética, Sidnei Toaldo (Patriota), para que haja a votação em Plenário.
E-mail com ofensas racistas enviado a Freitas foi forjado
Em 1º de junho, a Sindicância da Corregedoria da CMC concluiu que não foi o vereador Sidinei Toaldo (Patriotas) quem enviou e-mail com ofensas racistas.
A apuração concluiu que a mensagem foi disparada de um "serviço de disparo de e-mails anônimos hospedado na República Tcheca 'capaz de mascarar o destinatário”. A conclusão foi enviada ao TJ-PR.
De acordo com a Diretoria de Tecnologias de Informações e Comunicações (DTIC) da Câmara, houve uma falha nos critérios do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) para identificação de spam e que esse alerta já foi feito ao órgão.
"Pode-se afirmar com total certeza que a mensagem apresentada foi forjada para simular o envio utilizando a estrutura de webmail da CMC", disse a sindicância.
Em 1º turno, maioria dos vereadores aprova cassação
As sessões especiais de cassação foram marcadas no dia 20 de junho, poucos minutos após a Câmara conseguir reverter na Justiça a decisão liminar que impedia a casa de marcar as sessões.
A CMC reservou dois turnos para a votação, conduzidos sob o mesmo rito de apreciação de um projeto de lei.
No primeiro turno da votação, em 21 de junho, 25 de 37 vereadores votaram pela cassação do vereador, o que validou a votação em segundo turno desta quarta.
Renato Freitas: entenda a cronologia do caso sobre a cassação do vereador em Curitiba
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